O crescente interesse em iniciativas ambientais, sociais e de governança (ESG) ocasionalmente gera desentendimentos entre seus defensores e os que buscam resultados financeiros. Engana-se quem tem a crença de que ações ESG devem ser buscadas a qualquer custo, assim como quem se restringe a focar em resultados financeiros de curto prazo. A maximização do valor de uma companhia requer uma visão abrangente, que incorpore não apenas os lucros tangíveis do presente, mas também os resultados futuros e os riscos associados. Nesse contexto, a consideração dos fatores ambientais, sociais e de governança emerge como uma necessidade que sempre esteve presente.
Ações ESG não devem ser perseguidas de maneira cega ou dogmática. Devem ser fundamentadas em análises críticas, livre de ilusões sobre uma harmonia automática entre os três pilares e a sustentabilidade empresarial. Por exemplo, a exploração de uma nova descoberta de petróleo pode trazer benefícios para a sociedade e a empresa, mas também pode ter impactos adversos para o meio ambiente.
A criação de mecanismos para a compensação de externalidades, como o mercado de carbono, representa um passo importante na direção certa. Ao atribuir um valor monetário às externalidades ambientais, esse mercado incentiva a adoção de práticas mais sustentáveis, alinhando os interesses financeiros das organizações com os objetivos de longo prazo da sociedade.
As práticas de "Greenwashing" e "Socialwashing" representam uma ameaça significativa à integridade do ESG. Igualmente, a mera conformidade “no papel” com as boas práticas de governança, sem uma implementação efetiva, se constitui em "Governancewashing", podendo ocultar casos de fraudes ou corrupção.
Para que as iniciativas de ESG de uma empresa gerem valor genuíno, é essencial que estejam alinhadas com sua essência. Ações desconexas de suas atividades, se implicarem em poucos recursos, podem ser consideradas demagógicas; e se demandarem muitos recursos, desvio de finalidade. A empresa deve concentrar esforços naquilo que está relacionado aos seus negócios, sem negligenciar seu impacto ambiental e social.
A avaliação dos benefícios econômicos das práticas de ESG requer uma análise cuidadosa. Embora algumas ações demonstrem viabilidade em dimensão reduzida, sua escalabilidade pode não se sustentar. Por exemplo, um produtor de alimentos orgânicos que opta por remunerar seus funcionários acima da média de mercado pode repassar esses custos para o preço final do produto, atraindo consumidores em um nicho específico dispostos a pagar mais por uma produção responsável. Entretanto, ao considerarmos a renda média dos oito bilhões de habitantes do mundo, as limitações dessas ações se tornam evidentes.
Estudos que associam ganhos financeiros a práticas ESG requerem uma análise cuidadosa, evitando a aceitação acrítica de conclusões potencialmente influenciadas por viés de confirmação.
Um exemplo disso seria a noção de que diversidade nos Conselhos de Administração conduz a melhores resultados financeiros, o que é amplamente difundido e confirmado por estudos. No entanto, conforme ressaltado por Alex Edmans em um recente artigo intitulado "Is diversity actually good for business?" (1) , muitas dessas pesquisas carecem de robustez metodológica e podem levar a conclusões diferentes do que um levantamento mais rigoroso produziria.
No entanto, é razoável esperar que profissionais da área financeira compreendam facilmente os benefícios advindos da diversidade. Basta aplicar os princípios do Capital Asset Pricing Model (CAPM). Tanto a diversidade quanto a diversificação financeira compartilham da premissa de mitigar riscos. Nesse sentido, a diversidade diminui os riscos associados ao pensamento de grupo, aos vieses cognitivos e aos pontos cegos, elementos frequentemente presentes em equipes mais homogêneas.
Sonia Consiglio destaca que “precisamos começar a falar de EESG - Economic, Environmental, Social e Governance. Precisamos trazer o ‘E’ do econômico para dentro, junto, incorporado aos fatores ESG. Ou vice-versa” (2) . ESG não pode ficar num mundo à parte de questões econômicas.
Além de assegurar que as iniciativas ESG agreguem valor à empresa, cabe também a companhia reportar adequadamente suas iniciativas. Temos visto avanços com novas normas divulgadas pelo International Sustainability Standards Board (ISSB) e a CVM. Mas a contabilidade precisa ir além, se modernizando para relatar não apenas quanto uma empresa ganha financeiramente, mas como ganha (2) . Tanto externalidades negativas quanto positivas precisam ser capturadas, mensuradas e relatadas.
O executivo de finanças emerge como uma figura central nesse processo, sendo incumbido da responsabilidade de capturar e relatar informações relevantes de forma transparente e precisa. Portanto, profissionais de finanças têm que se tornar letrados em temas de sustentabilidade e saber considerar fatores ambientais, sociais e de governança.
Em última análise, a integração efetiva de considerações EESG na tomada de decisões não apenas fortalece a posição competitiva das empresas, mas também contribui para um futuro mais sustentável. Esse processo requer uma abordagem equilibrada e fundamentada, livre de ilusões e baseada em análises criteriosas do impacto real das iniciativas de ESG e suas implicações financeiras.
(1) Is diversity actually good for business? | The Spectator, Alex Edmans, The Spectator, 11 de Fevereiro de 2024
(2) EESG, o novo ESG | Finanças | Valor Econômico (globo.com), Sonia Favaretto, Valor Econômico, 14 de Abril de 2020
(3) “Accountants Will Save the World”, Peter Bakker, 05 de Março de 2023, Harvard Business Review, Uma versão de livre acesso que comenta o tema está disponível neste link: https://hbr.org/2013/03/accountants-will-save-the-world
Sobre o autor
Charles Laganá Putz é membro do Conselho de Administração do IBEF-SP, do Grupo Dierberger, do Chartered Institute of Arbitrators em Londres, e da Make-A-Wish, e sócio fundador da Verena Ventures. Foi Professor da EAESP-FGV, e CFO e CEO de grandes empresas. Atuou como Presidente de Conselho e Conselheiro de Administração e Coordenador de Comitê de Auditoria e Finanças de empresas do Brasil, nacionais e multinacionais, de capital aberto e fechado e estatais, sendo certificado pelo IBGC CCA+ e CCoaud+. Graduou-se e pós graduou-se na EAESP-FGV, fez mestrado no IMD, Suíça, e cursos de especialização em Harvard, Wharton e outras instituições.
(*) Este artigo reflete a opinião do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações.